"Há tantos anos me perdi de vista que hesito em procurar me encontrar. Estou com medo de começar. Existir me dá às vezes tal taquicardia. Eu tenho tanto medo de ser eu. Sou tão perigoso. Me deram um nome e me alienaram de mim." - Clarice Lispector.

domingo, 27 de outubro de 2013

Cartas sobre Assis - segundas observações

Assis, 27 de outubro de 2013

Querido leitor,

Sei que há muito não escrevo nenhuma de minhas observações, mas o que acontece é que o lugar é demasiado grande e destruído para que eu o observe com afinco em pouco tempo para lhe escrever. 
Algo estranho que observei foi que as criaturas de que lhe falei não apareceram desde então. Talvez, quem sabe, elas estivessem em algum tipo de abrigo, ou então procurando algo para comer, porque eu realmente não faço ideia de como se alimentam. Por serem uma mistura de tudo e nada ao mesmo tempo, eu não tenho como prever o que comem. Só espero que não sejam pessoas como eu, pois o fato de não existirem pessoas como eu me assusta um pouco...
Aproveitei essa "saída" das criaturas para perambular pela cidade e tentar entender porque tudo está tão destruído. Andei pela antes conhecida Avenida Dom Antonio e percebi que todas as lojas em volta, inclusive o grande mercado Avenida Max, estava destruído. As pessoas falavam muito dele há alguns anos, antes de tudo isso acontecer. 
Vi que muitos destroços atrapalham nosso caminhar, e como não haviam árvores antes na avenida, parece-me que a destruição foi feita num tipo de guerra. Sim, pois destroços de lojas muito distantes do meio da avenida estão neste lugar. Preciso averiguar mais sobre isso. Quem sabe se algum dia eu consiga ir até a UNESP ou a FEMA para ver os registros da TV UNESP e da TV FEMA eu consiga descobrir alguma coisa sobre isso...
Andando mais a frente, eu percebi que a destruição em nada mudou o clima dessa época da cidade, está calor como nunca esteve, e é possível até passar mal se não se tomar algum cuidado quanto a isso. Não posso passar mal, não numa situação dessas. Não sem saber o que realmente aconteceu aqui.
Segui até o centro, onde observei mais lojas destruídas e saqueadas. Parece-me que esses seres se preocupam com as necessidades básicas de um ser humano, talvez isso os torne ainda parecidos com seres humanos apesar de toda hibridação por eles sofrida.
Caminhei até o Homem de Lata, a estátua de lata de São Francisco de Assis. Não quis ir mais longe, pois me encontraria muito longe do meu abrigo (coisa que eu já estava) e não teria para onde correr. O caminho para chegar ao Francisco de Lata é uma subida, a Avenida Rui Barbosa. De lá de cima, é possível ter uma vista privilegiada da cidade. Essa antes até bonita. Quando olhei para a cidade de lá novamente, com esse quadro, eu não a achei tão bonita. Prédios caíram, implodiram alguns ao que me parece, lojas totalmente aniquiladas, casas pulverizadas, tudo muito destruído. Só alguns locais ainda inteiros pela metade, mas que não serviriam de bom abrigo se por algum acaso eu precisasse fugir e me esconder das criaturas ou de alguma outra coisa. Digo isso pois como descrito na primeira carta, eu percebi que as criaturas são amigáveis, mas algo acontece de noite que elas são agressivas. E percebi que isso sempre acontece depois de um forte ruído que percorre a cidade. Não sei dizer o porquê, mas sei que isso acontece. Essa é outra coisa que preciso observar melhor.
Voltei para meu abrigo pela tarde, quase noite. Não tive muitos problemas, e como havia alguns dias que o ruído percorria a cidade e nada acontecia, eu andei tranquilamente até anoitecer um pouco. O ruído veio, mas as criaturas não.
Nos próximos dias tentarei perceber a chegada das criaturas e entender o porquê delas terem ido para qualquer outro lugar. Isso é deveras muito estranho.
O ruído já passou pela cidade hoje. Muito estranho, pois é fim de tarde. Será que as criaturas já voltaram? Preciso ir ver isso! Levarei comigo uma lanterna e se encontrar aqui no abrigo, pelo menos uma faca. Só Deus sabe o que me aguarda lá fora. 
Preciso ir. Escreverei em breve, se nada de mal me ocorrer.

Até mais,
Minhas sinceras considerações,
Fara.
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sábado, 12 de outubro de 2013

Cartas sobre Assis - primeiras observações

Assis, 12 de outubro de 2013

Querido leitor,

Escrevo de forma geral pois não sei quem você é. Escrevo porque este é meu primeiro dia escrevendo para você e também meu primeiro dia neste ambiente diferente do qual estava acostumada. Sim, sou mulher, mas não me identificarei, falarei simplesmente que me autodenomino Fara, para que não me encontrem e me identifiquem, o que tornaria meus relatos bem mais difíceis de serem continuados.
Estava andando pela cidade há pouco tempo e percebi coisas diferentes, coisas estranhas nesse ambiente em que agora vivo. Seres estranhos... Não são pessoas, porém também não são animais, não são plantas, e ao mesmo tempo são algo intermediário, e não o são. É algo complicado descrevê-los, mas os vi a quase todo momento, movimentando-se pela cidade, que estava muito vazia para o meu gosto. Queria ter visto pessoas como eu, mas acho difícil encontrar pessoas assim. 
Esses seres são amigáveis, não são hostis a estrangeiros, porém não são muito afeitos a conversas, nem a um convívio mais intenso. Eu até entendo a atitude desses seres, mas não entendo porque fazem esse tipo de coisa. Andam juntos quase que o tempo todo, mas parecem não gostar da companhia um do outro. Seres estranhos.
Bom, eu preciso me apressar. O quadro é de destruição e preciso tentar encontrar pessoas, animais e plantas, não tudo junto e nada junto ao mesmo tempo. 
Percebi uma movimentação do lado de fora do meu abrigo. Preciso ir, pode ser que queiram me levar a algum lugar que estavam se dirigindo há pouco tempo, mas eu não sei para onde foram e muito menos o que fazem lá. Afinal, das minhas primeiras observações sobre este lugar, nada de concreto pôde ser constatado. Vejamos mais tarde. 
Preciso me apressar.

Até mais, 
Minhas sinceras considerações,
Fara.
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