"Fique perto de qualquer coisa que faça você feliz por estar vivo"
Comigo foi assim. Foi lá por 2007, quando um amigo muito querido sugeriu que nós fizéssemos "O Fantasma da Ópera" na escola. Não lembro bem se foi realmente com isso, mas me lembro que foi com o livro d'"O Fantasma da Ópera" que pensamos em fazer cenas de "Macbeth" para o projeto do final de curso de inglês... Ah, ele com certeza era muito mais viciado no bicho do teatro do que eu na época... Tanto é que depois ele se dedicava muito mais às coisas relacionadas ao mesmo do que eu... Mas sei que eu não prestava muita atenção, e passei a prestar. Passei a querer entender e me questionar:
- Como é que aquele povo lá em cima pode ser mais de uma pessoa ao mesmo tempo?
- Como é que funciona esse fazer-se e desfazer-se do ator?
- Como isso tudo pode ser tão mágico e pleno?
E os questionamentos só foram aumentando com o tempo... Acredito que tenha sido em 2008 mesmo que entrei no Ponta de Linha, juntamente com o Paulo Victor, esse meu amigo que citei antes... Entramos por conta da apresentação do ano anterior e por conta da nossa então professora de canto, Etienne, que nos disse que havia um grupo na cidade, com o qual ela trabalhava, com vagas para as pessoas. Lá, conheci pessoas importantíssimas pra minha vida (não só teatral). Tive a oportunidade de conviver mais com minha tia, que fazia parte do grupo. Sei que eu e Paulo vimos como funcionava a produção de "Morte e vida severina", que minha tia a outros membros fizeram parte... E achei tudo aquilo muito mágico! Porque só tinha visto como espectadora, não como membro daquilo... E nossa, hoje em dia sei o quanto o espectador perde por não ver tudo o que há por trás e ao mesmo tempo sei como é mágico para o público não saber de tudo aquilo que há por trás.
Muitas coisas aprendi com o Ponta de Linha. Como se portar num grupo de teatro ou não. Como lidar com as pessoas num grupo ou não, o que fazer ou não... Foi tudo muito valioso. Naquela época, li um livro e meio do Stanislavski, que me foram muuuuitíssimo valiosos, e são até hoje! Queria ter lido mais livros que haviam disponíveis na nossa biblioteca do grupo, dentro da biblioteca municipal!
Bem, em 2010 eu saí, o grupo mesmo se desfez. Aprendi que é com sinceridade e dedicação que um grupo de teatro se mantém ou não.
No mesmo ano, na escola, eu e mais alguns alunos, pedimos ao diretor que trouxesse alguma professora de teatro. Ele trouxe. Não durou muito, mas apresentei o poema mais famoso de Carlos Drummond de Andrade - "No meio do caminho". Queria mesmo era ter interpretado "Na batucada da vida", música cantada por Elis Regina, mas vá lá. Tive meu gosto em interpretar um poema. Gostei muito, mas como eu disse, não durou muito.
Vim para Assis em 2011 e logo que entrei, o bichinho do teatro me picou novamente, sabendo que havia oficina de teatro na faculdade, fui logo atrás e arrastei algumas pessoas comigo. Entrei, então, para o Gru.t.a. Marginal, grupo com o qual eu tive o gosto do palco finalmente. Aprensentamos 5 vezes "Orion", tanto em Assis, quanto em outras cidades. E a sensação da produção e atuação nesta peça me vem até hoje como um sentimento muito bom de conquista, de saber que eu sou boa em alguma coisa - e também que eu poderia fazer maior, fazer melhor alguma coisa mais de uma vez. Sinto saudades da Quimera até hoje... Sou muito grata a todos que participaram do Gru.t.a. comigo e que participaram dele antes de mim e depois de mim... Creio que ele existiu até 2012 ou 2013. Tem uma história muito bonita e digna de memória. Mas durou o quanto tinha que durar, como o Ponta de Linha também.
Foi muito triste pra mim viver longe do teatro de 2012 a 2014, se bem que em 2012 eu, um antigo amigo e Luiz Bosco iniciamos um projeto com o finado e de curtíssimo período Grupo Ode. Foi uma pena, "Válvulas" seria incrível, mas infelizmente não deu pé. Coisas assim me fazem crer que cada coisa acontece no momento certo.
Bom, fiquei longe do bicho do teatro, então, mais ou menos de meados de 2012 até o fim do ano passado. E nossa, como isso me doeu. Vejo hoje que o teatro me fazia viva, me fazia feliz. E por isso voltei a fazer teatro, com o Cena Voraz, grupo daqui da cidade. Bendita a hora em que vi a postagem no grupo da UNESP que o Hedpo tinha postado. Bendita a hora! Foi como uma salvação pra minha alma voltar a fazer oficinas e agora essa semana... apresentar de novo! Apresentamos para o Mapa Cultural Paulista, o que nos classificou para as regionais, mas a estreia foi a estreia... Não existem palavras pra descrever o que é viver tudo isso... É algo de outro mundo!
"Nossa, mas você está exagerando, não é tudo isso". É tudo isso sim, e mais um pouco. É incrível ver a si mesmo em outra pele, ver a si mesmo não como você mesmo, mas como o personagem que você está fazendo. É indescritível encontrar partes de si mesmo em cada papel, e ainda assim, saber que não é você. A energia que flui entre as pessoas, quando estão em cena, é de outro mundo. É como se Dionísio realmente visitasse o corpo de cada um e trouxesse consigo a força de seu teatro e sua loucura!
Estou escrevendo esse texto para mostrar como o bichinho do teatro funciona em quem realmente dá a alma pro palco: é algo intensamente lindo. Capaz de infectar a plateia, com essa doença tal que não se assemelha com nenhuma outra, porque quanto mais você tem, mais você vive!
Sou muito grata a todos os grupos dos quais já fiz parte. Não foram muitos, é verdade. Mas em todos me senti plena. Me senti completamente eu mesma. Sinto pena pelos espetáculos que não ocorreram e sinto orgulho daqueles que participei, e sei que dei meu melhor. Espero dar o melhor de mim sempre, e novamente, e novamente de novo!
Vou terminar este texto com o trecho do filme "O Libertino", que traduz, sempre traduziu, o que sinto pelo teatro:
"- Pergunte a si mesma o que você quer do teatro.
- Eu quero o amor apaixonado da minha platéia, eu quero movimentar o meu braço e levar seus corações para longe. E quando eu morrer, que eles suspirem por nunca me verem novamente... até a próxima apresentação.
- Aí está sua resposta. Eu quero ser um dessa multidão. Desejo ser emocionado. Eu não consigo sentir na vida. Eu preciso ter outros para fazer isso por mim no teatro.
- Você é conhecido como um homem que anseia pela vida...
- Eu sou o cínico da nossa idade de ouro. Este prato abundante, que nosso grande Charles e nosso grande Deus têm, mais ou menos em mesma medida diante de nós, me irrita. A vida não tem propósito, está em toda parte desfeita por arbitrariedades. Eu faço isso, e não importa nenhum pouco se eu fizer o contrário. Mas no teatro, cada ação, boa ou má, tem suas consequências. Derrube um lenço e ele voltará para te sufocar. O teatro é minha droga, e minha doença está de tal forma avançada que o meu tratamento tem que ser da melhor qualidade."
E postei essa música d'O Teatro Mágico porque a letra dela é linda, acho muito profunda, e também por causa deste trecho:
"Quando há ferrugem no meu coração de lata
É quando a fé ruge, e o meu coração dilata"
É exatamente isso. Quando sinto que meu coração está longe daquilo que amo, quando sinto que estou me tornando mecânica, quando sinto que o teatro está longe de mim demais pra que eu aguente viver, eu procuro o que me faça viva. E, no meu caso, o teatro foi, é e sempre será meu maior e melhor tratamento psicológico. As pessoas envolvidas... Principalmente as pessoas envolvidas, graças aos deuses, sempre foram seres humanos incríveis, e de corações enormes. E sempre me fizeram querer viver cada vez mais. Por isso eu digo que tenho orgulho de fazer parte do Cena Voraz, assim como tive orgulho de trabalhar com o Paulo, orgulho de participar do Ponta de Linha e também do Gru.t.a.... E sinto muitas saudades desses que não existem mais.
Às vezes fazemos algumas coisas por fazer e acabamos descobrindo que nos sentimos melhores e maiores com elas. Essas são as melhores descobertas!
Evoé, Dionísio!
Que teu teatro seja sempre assim:
Capaz da Locura e do Amor
Capaz da Sabedoria e da Insensatez!
Evoé!
Abençoado seja teu teatro!
~*~
Música:
"Quando a fé ruge", O Teatro Mágico.
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