"Há tantos anos me perdi de vista que hesito em procurar me encontrar. Estou com medo de começar. Existir me dá às vezes tal taquicardia. Eu tenho tanto medo de ser eu. Sou tão perigoso. Me deram um nome e me alienaram de mim." - Clarice Lispector.

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Queen of the Witches


Noite alta. A lua se mostra cor de sangue. Tento forçar-me a manter meu propósito, porém coisas mais fortes que minha vontade me chamam para fora.
Céu revolto em nuvens. Vento frio e suave a soprar. Com certeza choverá. O esforço em me manter no propósito inicial começa a desaparecer. Algo ignoto me chama para fora.
É doce o caminhar até o portão. A lua está já bem alta, vermelha e serena dentre as nuvens apressadas que se mexem no céu.
- É tempo, minha querida... - Ouço a voz suave que me chamava dizer novamente em meu ouvido - É tempo de encontrar sua essência. Vai. E sê feliz.
Caminho confuso este que traço. Saio do portão e, guiada pela direção em que as nuvens correm e revolvem-se, criando novas e destruindo antigas, vou ao local que meu coração - ou este algo desconhecido - me guia.
A mata é densa e fresca. O vento vindo dela é revigorante. As árvores estão posicionadas de uma forma bela e assustadora: assim como parecem formar uma fortaleza que protege de todo mal existente, igualmente parecem sufocar, parecem prender em um labirinto sem fim nem começo determinável.
Uma escada leva à parte baixa. Lá, dentre as árvores, corre um rio perene, de águas realmente muito límpidas e calmas. Dentro, vejo rochas, algumas grandes, outras nem tanto, porém todas brilhantes por conta do reflexo da luz do luar. Um quê de mistério, paixão e desejo me impele a chegar mais perto do rio. Caminho calmamente até meu destino, sentindo o coração batendo, e parece somente ele existir dentro de mim. Todo meu corpo está envolto num tipo de hipnose que me leva àquele lugar - donde, a meu ver e sentir, nunca deveria ter saído.
- Mas quando cheguei aqui? - penso comigo enquanto esta sensação me habita - Por que sinto essas sensações? Nunca vim para estes lados, nem sequer sei como aqui vim parar. Somente segui meu coração. como vim para este lugar que me parece tão familiar, mas ao mesmo tempo me é estranho, me é desconhecido?
Chego à beira do rio. Ajoelho-me perante ele e olho profundamente aquelas águas límpidas. O luar de sangue próximo ao meu reflexo me fascina ainda mais. Já não tenho mais como fugir.
- Já está na hora, minha querida. Você agora deve entender o por quê de todos esses sentimentos confusos dentro de seu ser. Chegue-se mais perto e veja em seu reflexo a sua história. Veja quem realmente você é.
Subitamente uma força me faz mergulhar meu rosto no rio. Tenho falta de ar, estou me debatendo, mas a sensação não é ruim - é de alívio e paz.
De repente, vejo-me correndo dentro daquela floresta. Meus cabelos revolvem-se com o vento. Meu vestido não é o mesmo - é de um tecido leve e visivelmente artesanal, e não é de minha época. Corro para a direção do rio e me vejo sentar à sua beira. Lá, faço desenhos com a terra à minha frente. Após, retiro uma adaga de minha cintura e, num golpe rápido e fulminante corto meu pescoço.
Nesse momento volto a me debater e a sentir muita falta de ar. Então levanto minha cabeça e tento recompor-me e entender o que havia acontecido.
- É isso mesmo que entendi? - pergunto para ninguém, ou para o alguém ou algo que ali me chamara - Era eu aquela mulher de um tempo antigo?
Olho para o céu. As nuvens se revolvem com mais rapidez e ferocidade. O luar de sangue permanece intacto e imóvel. A lua está enorme e hipnotizante.
Como não recebo resposta, desisto de perguntar. Levanto-me e recomeço minha caminhada.
Não há nada que se fazer a não ser ali caminhar, a não ser ali vagar, à espera de alguma resposta a uma pergunta indubitavelmente já respondida.
Sento-me em uma das rochas do rio e fico ali a pensar. O vento revolve meus cabelos e faz um reflexo interessante no rio.
- Era eu. Tenho absoluta certeza - eu digo mirando meu reflexo - Mas quem eu era? E por que fiz aquilo? Se é tempo de saber, quero saber!
Miro o luar. Ele fascina. Hipnotiza. Seduz. E não esclarece absolutamente nenhuma de minhas dúvidas. Eu o miro e ele retribui. Misterioso. Intenso. Assustadoramente belo.


~*~
Música:
"Queen of the Witches" - Thuata de Danann.

1 comentários:

Sempre Que Penso... disse...

Oi minha linda!!!!!!!!!
Pois é... Nem me imagino sem minha mãe, e fico pensando o quanto dificil é pra vc. Agora só resta morar nas belas lemrbanças que ela deixou pra ti!! Bom que veio me ver!! Adoro sua visita!

Grande Abraço!

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