"Há tantos anos me perdi de vista que hesito em procurar me encontrar. Estou com medo de começar. Existir me dá às vezes tal taquicardia. Eu tenho tanto medo de ser eu. Sou tão perigoso. Me deram um nome e me alienaram de mim." - Clarice Lispector.

domingo, 11 de maio de 2014

Carta ao meu Maior Trauma

Eu escolhi falar sobre isso hoje... Por quê? Em pleno dia das mães, por que falar de mim? Porque falar de mim ajuda a entender porque eu não posso felicitar o meu Maior Trauma. Sim, com letras maiúsculas porque é uma pessoa. Enfim... Vou explicar em linhas gerais o que aconteceu, e porque eu preciso me desligar do meu Maior Trauma.
Eu escolhi essa imagem à esquerda para falar sobre isso porque era assim que o meu Maior Trauma agia. Eu tinha 11 anos. Era uma criança, não tão pequena quanto a criança da foto, mas o que me fazia frágil era o fato de eu ter acabado de perder minha mãe no ano anterior, e outra presença no "lugar" dela me faria confusa, como sempre fez.
Meu Maior Trauma, você poderia ter tentado compreender o meu lado de criança... Mas não quis ou não tentou... Eu queria muito conhecer você, te entender, me colocar disponível para conversas e para a sua confiança, como sempre fiz, sempre fiz mesmo a despeito de tudo o que você fazia comigo...
Sei bem que você tentou me ajudar, tentou educar as coisas que eu ainda não tinha aprendido, tentou ensinar coisas de mocinha para mim. De certa forma, conseguiu, e sou muito grata por isso. Uma coisa que eu aprendi com a minha mãe foi agradecer as pessoas antes e depois de um favor feito para que não fôssemos ingratos pelo favor feito, e eu sou grata. Porém, Maior Trauma, você me fez muito mais mal do que bem, e temo que fará a mais alguém também...
Na minha sincera opinião, é possível ser sincero sem que se destrua a pessoa. Sem que machuque os outros. Isso é uma medida de consideração, de amor ao próximo. Você não pode fazer sua visão valer acima da dos outros somente porque é o que você quer. Você não pode querer tudo só para si e deixar os outros sem nada. E foi exatamente isso que aconteceu comigo...
Eu passei o período dos meus 11 aos 18 anos só querendo fazer o bem a você, Maior Trauma. Só querendo que você fosse feliz na família que estava adentrando. Se eu fui incapaz de conseguir isso, me desculpe, mas eu tentei muito e intensamente... Deixei de fazer várias coisas para mim nesse período para que você fosse mais feliz. Para que você tivesse tudo o que queria. Para que você pudesse ser feliz, enfim... Mas eu creio que você não entendeu isso muito bem, porque me parece que você nem quer me ver mais na frente... Tudo bem, eu entendo. Eu guardo as coisas pra mim para não machucar as pessoas, diferente de você, que põe tudo para fora sem pensar nos outros, ou no que isso vai acarretar mais pra frente.
Bom, o fato é que eu me afastei de você, e agora estou repelindo você e qualquer contato porque os traumas são maiores do que a vontade de fazer você feliz agora. Eu quero me fazer feliz, e isso não inclui você, ao que me parece. Porque tudo e qualquer coisa que se aproxime de você tem que fazer tudo e qualquer coisa ao seu modo. Não há espaço para mais ninguém, você preenche tudo, absolutamente tudo. E eu não vejo um espaço pra mim nisso. Nunca vi na verdade. Mas tentei bravamente ter um espaço.
Maior Trauma, eu não queria que você me odiasse, mas parece que é o que aconteceu... E eu não queria isso, pois isso me afasta ainda mais de quem eu amo... E eu tentei amar você por muito tempo. De verdade.
Porém, o fato é que seus gritos e seus insultos ecoam, sempre ecoaram, na minha cabeça. E eu preciso me livrar deles, mas você é meu Maior Trauma. E eu simplesmente não consigo me desligar de você por conta disso...
Todos os insultos sempre me fizeram uma pessoa com baixa ou nenhuma autoestima. Somente agora estou conseguindo dizer a mim mesma "Você é bonita. Você é inteligente. Você é demais! Seu cabelo é lindo! Você não é gorda, tem que se aceitar como é!"... Mas às vezes ainda tenho "recaídas" e me sinto mal por ser eu mesma...
Somente agora eu estou conseguindo me desligar dos pensamentos que você tem por mim. Mas ainda sofro muito lembrando de tudo o que você me fez. Feliz ou infelizmente, sem isso eu não seria a pessoa que eu sou, mas sei muito bem que eu poderia ter aprendido de outra forma que não com gritos e insultos que me corroessem por toda minha vida...
Esta carta que escrevo indiretamente a você é para dizer que eu desisti de viver pacificamente com você, porque isso não é possível. Somos muito diferentes. Você pensa que dizer a "verdade", o que pensa, machucando os outros é ser verdadeira. E eu não concordo com isso. Eu acredito que dizer a verdade, ser verdadeira, é necessário, mas não devemos machucar os outros a todo custo. Você destruiu a pessoa que existia em mim dos meus 11 aos meus 18 anos. Isso não vai acontecer mais. Eu não quero mais isso. Como eu disse, você me fez mais mal que bem, embora tenha feito algum bem. Eu reconheço isso. Mas até me chamar de ingrata você me chamou... Então eu não vou mais aguentar nada que venha de você, doa a quem doer.
Sempre aprendi que não devemos ser iguais aos outros, mas sim melhores. Tentei por muito tempo ser melhor que você, aguentando quieta o que você me dizia. Eu não vou mais aguentar nada porque 7 anos é muito tempo de quietude, muito tempo eu tendo minha boca calada. Se algum dia nos encontrarmos novamente, eu faço questão que o "teatrinho" que fazíamos antes não se mantenha: você fingindo que me amava apesar das minhas "atitudes" e eu obedecendo porque não queria te machucar. Pra mim chega. Eu neguei a mim mesma por muito tempo. Perdi momentos preciosos da minha vida por você, e se só estou falando isso agora é porque não gosto de jogar as coisas na cara dos outros como você adora... Porque você nunca reconheceu que eu também fiz coisas por você.
Mas enfim, estou aqui. Se precisar de mim, é claro que vou ajudar. Mas não me peça para que eu me negue novamente, porque isso não vai acontecer!

2 comentários:

jessica rocha da fonseca disse...

Me identifiquei demais. Lindo desabafo!

Mariana Rocos disse...

Muito obrigada, Jessica!

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