"Há tantos anos me perdi de vista que hesito em procurar me encontrar. Estou com medo de começar. Existir me dá às vezes tal taquicardia. Eu tenho tanto medo de ser eu. Sou tão perigoso. Me deram um nome e me alienaram de mim." - Clarice Lispector.

terça-feira, 26 de abril de 2011

Uma breve história...


Ângela escrevia um diário. Mas escrevia sempre que podia e queria - não todos os dias. Ela não achava que escrevendo um diário sanaria suas dúvidas em relação a si mesma (muito pelo contrário), nem queria, através dele, deixar suas marcas em seu tempo. Ela queria, antes, aprender consigo mesma. Ser uma espécie de psicóloga de si mesma, sua própria psiquiatra.
Não queria fazer alarde. Não queria atenção (pelo menos não com o diário). Queria que, escrevendo, ela pudesse se curar das suas próprias dores, frustrações. Ela, inutilmente, acreditava que ler as histórias de si mesma a faria mudar, a faria encontrar algum sentido na sua existência tão invisível e insignificante.
Hoje, Ângela queria realmente escrever algo para desabafar. Algo que somente ela leria. "Inútil", pensava, "totalmente inútil essa merda de diário e essa minha merda de ideia. Mas, vá lá, eu estou mesmo precisando me abrir comigo mesma um pouco..."
Ela pegou seu caderno, sentou-se à escrivaninha do seu quarto e começou a escrever:
"Eu queria, realmente, poder dizer 'fodam-se, meus sentimentos!', mas eu não posso. Não posso porque eu sou um misto de emoção e razão tão mal misturado que, não raro, são as emoções que predominam. E eu queria poder dizer isso porque essas coisas escrotas chamadas 'sentimentos' são inúteis à construção do meu conhecimento. Elas, não raro, atrapalham-me à farta, sem que eu consiga controlá-las. Mesmo agora eu deveria estar estudando algo, mas meus sentimentos, essas malditas pragas, impedem-me o raciocínio.
Eu tenho vergonha de ser assim. Isso não é bonito. Isso não é bom. Isso não é nenhum pouco vantajoso e só me atrasará para o resto da minha vida.
Por que eu escrevo essa merda de diário? Isso por um acaso vai me ajudar? Isso por um acaso é inteligente, útil? Acrescenta algo à minha existência? Será que a minha ridícula existência importa? Eu faço alguma diferença? Só o que eu vejo é: eu, pedindo ajuda, e alguns respondendo ao meu socorro - eu nem sei por quê!
DANEM-SE, MEUS SENTIMENTOS!
O QUE EU GANHO COM VOCÊS?!"
Neste ponto, Ângela revoltou-se e jogou seu diário longe. Quase acertou a janela, o que faria seu diário desaparecer, posto que morava no alto de um prédio de uma movimentada metrópole.
Quando foi pegar o diário do chão, viu a movimentação da cidade e se perguntou por que seria tão importante viver - e mais, por que seria tão importante viver em sociedade. "Por que é importante a vida humana? Ela me parece vazia de sentido... Por que ela me parece vazia de sentido, sendo que para muitos ela é o que há de mais importante?"
Em seguida, ela viu uma mulher com roupas maltrapilhas levando em seu colo uma criança e de mãos dadas com um menininho, também com roupas sujas e esburacadas. Eles andavam sem chorar, sem reclamar, sem, enfim, queixarem-se, quando tinham todo o direito de fazê-lo.
Assistindo a essa cena, Ângela odiou a si mesma profundamente. Como podia ela se preocupar e sofrer por tão pouca coisa quando outras pessoas estavam em situações verdadeiramente ruins?
"Eu sou uma cretina, uma desgraçada egocêntrica e medíocre. Eu não mereço ter tudo o que eu tenho", pensou.
Rápido, frio, desconsertante foi o pulo. No fim, o concreto amenizou a sua queda, e seu pescoço ficou encarregado de amortecê-la.
Dormiu o sono de Hades na rua em frente ao seu prédio.
- Mãe, corre! Pede pra alguém chamar uma ambulância! - gritava o menino maltrapilho após ter visto a cena.
- Ih, meu filho... Essa daí já não tem salvação. Essa gente covarde que se mata não tem jeito mesmo... Têm tudo e ainda se matam... Se a mãe tivesse o que essa gente tem, daria muito mais valor e faria muito mais proveito! Anda, meu filho, vem cá... Não fica olhando pra isso não... É feio por demais... Não tem mais o que a gente fazer, vamos embora. Depois isso fica na tua cabeça e fica com problema mais pra frente... Vambora, meu filho!
A mãe com o bebê no colo pegou de novo a mão do filho e continuou sua caminhada. Enquanto chegavam ambulâncias, chamadas por alguns que viram a queda, a mãe pedia comida no mesmo hotel de que Ângela saltara.
O recepcionista foi benevolente e a família conseguiu pousada e comida - ao menos por aquela noite.

26/04/2011.
Terça-feira.
18h40min.

~*~
Música:
"The show must go on" - Queen.


1 comentários:

Rhenan disse...

Semana passada minha professora de calculo disse que os matematicos usam umas girias....quando um grafico ascende e decresce, tem sua 1ºderivada positiva e a 2ª negativa. Portanto a giria seria o seguinte: se tudo esta ocorrendo bem, vc esta ascendendo e consequentemente sua derivada eh positiva. portanto vc esta no meio de um grafico, que representa sua vida, dependendo da potencia da funçao, ele pode ter varias oscilaçoes, mas naum deixe q ultima derivada chegue, pois ela pode terminar de dois modos: ou vc ira ascender infinitamente, ou decrescer infinitamente. Logo, naum arrisque tentar chegar ao fim, se eh q me entende. o seu fim afetara a funçao q representa todos q te amam e com certeza o grafico ira decair muito. Portanto tente esquecer... sentimentos todos tem, mas para alguns eh mais compensador, naum querer te- los, como vc, ou simplesmente deixa-los de lado, mas lembre -se q uma pessoa sem sentimentos eh fria e desagradavel, o q tornaria mais intensa a negatividade da sua derivada.
"Minha dor é perceber
Que apesar de termos
Feito tudo o que fizemos
Ainda somos os mesmos
E vivemos
Ainda somos os mesmos
E vivemos
Como os nossos pais...".
Viva e esqueça os sentimentos ruins. e deixe q sua derivada volte a ser +.

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